A principio, viveu imerso numa imaginação que ocupava os vazios do desconhecido. No lugar da abstração, o puro experienciar em harmonia com o indagar-se sobre as coisas.
Com o passar do tempo, esses vazios passaram a ser preenchidos com aquilo que mais indubitável pudesse parecer e aparecer. A constância e regularidade das coisas foram factíveis de acalmar o agitado Ser que via nessas qualidades uma fidelidade, uma resposta sincera do mundo.
Dali em diante, a imaginação mudou seu lugar. Passou a ser o inútil da vida. Passou de exercício a hobby. De essência a um contemplar barrado, sempre advertido de que "aquilo não é a vida".
E assim segue. Reproduz-se um mundo sem porques. Um mundo pensado, e não vivido. A invenção foi destituída de sua semântica mais pura e se tornou um objeto bem delimitado.
E depois de tanto tempo de surgimento desse Ser estranho, o que estranha é o dar-se conta de que não se evoluiu. Ou, pelo menos, a sensação de que não se evoluiu aquilo que se esperava. A crença num controle, no fechamento de possibilidades, proporcionou a estes seres um degustar da vida. E só.
Para um Ser faminto como esse, é muito pouco.
Para um Ser sempre convocado e afetado, significar o que se sente já é tarefa árdua. Imagine adotar significados impessoais e impô-los? Já dizia Merleau Ponty: "O conceito inteiro e o pensamento objetivo inteiro vivem de um fato inaugural cuja expressão é: senti."
Ou seja, hoje se faz o caminho oposto. Já se "sabe" o que se sentiu. Está dado. É conhecido. Estudado e comprovado. Basta se desencobrir e adequar-se.
Empobrece-se a experiência e assalta-se os sentidos das existências.
E é dessa forma que caminha o Ser, em sua esteira moderna. Engessado e limitado.
Sem presença e sem lugar.
Da sua condição fundamental, foi - só - isso que conseguiu fazer. Estabeleceu uma atitude covarde e desconfiada com a experiência.
E quanto mais se pensa que o progresso está ligado naturalmente ao tempo, menos se compreende todo o sofrimento vigente.
Os vazios estão escancarados. E nunca estiveram tanto.