Em casa, na cama, mirando o teto, inquieto.
O sono que ali estava deu lugar a um sentimento estranho...
Sensação de perda. Perda de tempo, de vida, de espaço.
Em plena madrugada olhava os móveis repousados, calmos. E cada vez que atualizava essa calmaria em minha cabeça, sentia pontadas no coração.
Tudo a descansar marcava-me mais ainda o desassossego.
Os sons vindo da rua, dos carros, as vozes, os gritos das pessoas adentravam meus ouvidos e atravessavam a mente. Alguns tirando fino, outros porém indo em cheio em minhas memórias, excitando as sinapses virulentamente e causando a injustiça de alar o pensamento de um minado corpo.
Que pode aquele corpo? Que pode aquele ente?
Se por mais que ele queira algo, ele sabe que o efeito das suas ações só será sentido por si próprio. Que adianta? Se os pensamentos, meu e dos outros seres, não se entendem porque não se veem, não se tocam, não se cheiram. São universos, mundos distantes. Diversos.
Loucura querer misturá-los? Mas é só loucura o que fazemos. Se não, como estabelecer vínculos?
Somos feitos para enlouquecer. Ou melhor, somos o enlouquecer ativo. Somos aquilo que cria. Aquilo que está ai, no mundo. E isso deveria estar longe de ter um estatuto ruim para nós. Achamos ruim a angústia porque criamos e achamos que não criamos. Criamos e damos subsistência a criatura. E ela volta.
Volta de dia, volta de noite.
Na escuridão do quarto, essa heteronomia desperta. Com ela, a solidão, o desamparo.
E é lá, sozinho e estranho para aquela cama, com mãos quentes e pés gélidos, que tento me encontrar com tudo que criei.
E é lá, que durmo e acordo pra outro viver.